segunda-feira, 2 de maio de 2011

Análise da obra A Náusea Jean-Paul Sartre.

Análise da obra A Náusea Jean-Paul Sartre.

Ângela da Silva Leonardo – PG.UTFPR


A Náusea de Jean Paul Sartre é narrado em forma de diário, por Antoine Roquentin, protagonista , Roquentin é um historiador de 35 anos que após viajar por vários países abandona tudo e com suas economias se instala em Bouville uma pequena província para escrever uma biografia do marquês de Rollebon, uma figura do século XVIII. Roquentin é uma personagem introspectiva que vive sozinho em um hotel, outro personagem importante é o Autoditada é o único com quem Roquentin às vezes conversa, este personagem pretende ler todo o acervo da Biblioteca por ordem alfabética, ele representa o conceito de humanismo ridicularizado por Sartre e o intelectual sem críticidade. Outra ainda que podemos destacar é a dona do Rendez-vous Chiminots.

O tempo cronológico presente na narrativa é linear, ou seja, organiza-se segundo a concepção dominante do tempo (passado-presente-futuro), mas também o tempo psicológico tem destaque no texto, pois como trata-se de uma literatura intimista o fluxo de consciência marca a subjetividade da personagem, este recurso permite ao leitor aproximar-se da vida interior da personagem.

Açoitei Maurice Barres. Éramos três soldados e um de nós tinha um buraco no meio do rosto. Maurice Barrès se aproximou e nos disse: “Está bom!” E deu a cada um de nós um buquê de violetas. “Não sei onde enfiá-lo”, disse o soldado com a cara esburacada. [...] De uns tempos para cá, lembro-me com freqüência de meus sonhos. P. 95.

Já no inicio aparece a figura de Roquentin como um personagem introspectivo e às vezes percebemos um personagem “transtornado” e com medo das mudanças que estão por vir ”Já não posso duvidar de que alguma coisa me aconteceu.” p. 17

“Portanto, ocorreu uma mudança durante essas últimas semanas. Mas onde? É uma mudança abstrata que não se fixa em nada. Fui eu que mudei? Se não fui eu, então foi esse quarto, essa cidade, essa natureza; é preciso decidir.” “Acho que fui eu que mudei” (p 18), Neste trecho percebemos que a personagem ao se alto avaliar ainda não se deu conta das futuras mudanças.

Roquentin vive sozinho e vai com freqüência ao Rendez-vous de Cheminots, onde gosta de escutar a música Some of these days / You’ll miss me honey, mas também para fazer amor com Françoise. O fato de ser sozinho parecia não incomodá-lo, observava as pessoas reunidas e dizia que elas precisavam estar reunidos para existir, mas ele “Quanto a mim vivo sozinho, inteiramente só. Nuca falo com ninguém; não recebo nada, não dou nada. O Autodidata não conta. É verdade que existe Françoise, a dona do Rendez-vous des Cheminots. Mas falo com ela? Algumas vezes após o jantar [...] fazemos amor au pair” (trabalho que se faz em troca de casa e comida). (P. 21). A personagem parece não se incomodar com a solidão, pois até as lembranças o abandonaram-no, a única pessoa que se recorda é Anny, uma namorada que retornará a vê-la.

Um dos espaços principais são os cafés Mably e Rendez-vous des Cheminots, pois é nestes ambiente que começa a perceber a solidão, ao observar as pessoas e perceber nelas as necessidades da vida em conjunto, Roquentin se senti só, e isto começa a incomodá-lo “ Gostaria de falar com alguém sobre o que está me acontecendo, antes que seja tarde demais [...] Gostaria que Anny estivesse aqui. “(P.24)

Um ponto importante é quando a personagem começa a se dar conta da sua existência e perceber que não é livre, isso ocorre quando narra o episodio do papel no chão e abaixa-se para pegá-lo, mas não pode, “Permaneci curvado por um instante, li: “Ditado: A coruja branca”; depois me ergui, as mãos vazias. Já não sou livre, já não posso fazer o que quero.” (P. 26), e continua narrando desta vez fazendo uma constatação da sua existência com a não existência dos objetos “Os objetos não deveriam tocar, já que não vivem. Utilizamo-los, colocamo-los em seus lugares, vivemos no meio deles: são úteis e nada mais” p 26) e fala da primeira vez que sentiu ela a Náusea, estava na praia e sentiu um enjôo ao segurar uma pedra “Como era desagradável! E isso vinha da pedra para minhas mãos. Sim, é isso, é exatamente isso: uma espécie de náusea nas mãos.” P. 27.

Outro espaço importante é a Biblioteca onde passa a maior parte do tempo e às vezes conversa com o autodidata, na Biblioteca vai para escrever o livro sobre Rollebon e à medida que vai tomando conhecimento da sua existência e da não existência do senhor Rollebon, pois já esta “morto”, vai perdendo o encantamento por ele, o que antes dava-lhe prazer agora o repugna. “Durante muito tempo o homem Rollebon me interessou mais do que o livro para escrever. Mas agora o homem... o homem começa a me entediar”. (p. 30) [...]. O senhor Rollebon me enfada. [...] p.34 “. Ele para de escrever sobre Rollebon e começa a descrever o que está a sua volta e falar dos seus sentimentos como ele se vê, e termina dizendo. “Não tenho amigos: será por isso que minha carne é tão nua?

Outra passagem importante é quando Roquetin vai ao Rendez-vous dês Chiminots e sente novamente a Náusea e dessa vez ele fica perturbado, pois os cafés eram o refugio da solidão e agora ela aparece justamente nesse ambiente, ele foi ao café para “fazer amor”, mas Madeleine avisa que a patroa não está. “Madeleine veio flutuando para tirar meu sobretudo e notei que puxava os cabelos para trás e colocara brincos: não a reconhecia. [...] Sob as maçãs do rosto havia duas manchas cor de rosa que pareciam se entediar naquela carne podre. [...] Então fui acometido pela Náusea [...] e a partir daí a Náusea não me deixou, se apossou de mim” P.37, 38.

A personagem prossegue narrando vários acontecimentos, e impressões com um olhar muito subjetivo descreve as pessoas, os lugares, tudo é narrado com excelência dia a dia. Em uma terça feira de carnaval ele recebe uma carta de Anny sua ex-namorada e que há 6 anos não tem noticias, esta carta o deixa confuso e diria, ansioso, após uma semana que recebeu a carta desiste de escrever o livro ‘Segunda-feira já não estou escrevendo meu livro sobre Rollebon; isso terminou já não posso escrevê-lo. Que vou fazer da minha vida? P. 143.

O ponto crucial do romance é o momento do reconhecimento, da “epifania” , na qual reconhece sua existência e que não pode negá-la e ao mesmo tempo não vê mais sentido em continuar escrevendo sobre algo que não existe “O Sr. De Roll morreu...Não estou...Eu ex...” Isso continua, continua e não termina nunca.” P. 150. Este ponto retrata muito bem o existencialismo pois percebe que ele é o único responsável pela sua existência, o fato de pensar ou não querer pensar faz com que existimos, esta constatação o faz querer continuar a existir e buscar mudança. “Meu pensamento sou eu: eis porque não posso parar. Existo porque penso... e não posso me impedir de pensar.” P. 150. O pensamento é o que renova a sua existência, e para marcar a mudança é preciso sair de si, se distanciar do objeto “a figura do Sr. Rollebon”, “Meu canivete está sobre a mesa. Abro-o. Por que não? De toda maneira seria uma mudança. Coloco minha mão sobre o bloco e me desfiro uma boa canivetada na palma. [...] Quatro linhas numa folha branca, uma mancha de sangue, é assim que se forma uma bela recordação. Terei de escrever embaixo: “Nesse dia desisti de fazer meu livro sobre o marquês de Rollebon” p.151.

Após constatar sua existência o personagem encontra-se perdido sem razão para continuar a viver e busca uma forma para se libertar desta existência, a cena quando Roquentin está no café com o Autodidata e mata a mosca representa essa tentativa de libertação, pois como ele não sabe como fazer para conseguir se libertar ele faz um favor libertando a mosca daquela existência mórbida.

No circulo uma mosca se arrasta entorpecida, [...]. Vou lhe fazer o favor de esmagá-la. Ela não vê surgir o indicador gigante, cujos pêlos dourados brilham ao sol. – Não a mate, senhor! – exclama o Autodidata. A mosca rebenta, as tripinhas branca emergem de seu ventre; liberei-a da existência. Digo secamente ao Autodidata: Era um favor a prestar a ela. (p. 155)

Na tentativa de buscar um sentido a sua vida pensa no encontro que terá com Anny e deposita neste uma esperança de libertação, “Anny no momento é essa a minha única razão de viver” .p. 155.

Chega o dia tão esperado o encontro com Anny, ao chegar fica desconcertado nunca conseguiu compreendê-la, mesmo assim a reconhece e se sente feliz por estar ali, no começo a observa e imagina que ela não mudou, mas depois observa que o quarto está “nu” e que antes ela fazia questão de organizá-lo com seus objetos “em menos de uma hora, o quarto mais banal se revestia de uma personalidade marcante e sensual” p. 201. O encontro prossegue ela começa a contar porque o chamou e revela que mudou,.

- Aí está. Eu pensava que o ódio, o amor ou a morte se abatiam sobre nós como língua de fogo da sexta-feira santa. Pensava que era possível resplandecer de ódio ou de morte. Que erro! Sim, eu realmente pensava que isso existisse – ‘ o Ódio’ - , que pousava nas pessoas e as erguia acima delas mesmas. Naturalmente só existo eu, eu que se estira, se estira... é uma coisa tão semelhante a si mesma que é de admirar que as pessoas tenham tido a idéia de inventar nomes, de fazer distinções. P. 221.

Ao ouvir as palavras de Anny, Roquentin entra em êxtase, pois percebe que mudaram juntos e todo entusiasmo diz isto a ela, e começa a contar suas impressões sobre o existir, mas ela decepcionada revela que não suportaria ficar com alguém que pensa como ela, e que encontrou uma maneira de sobreviver “- Eu me... eu me sobrevivo? – repete pesadamente. P.221. Então percebe que Anny também está sozinha apesar de ter alguém que a sustente, mas isto não a incomoda está livre, indiferente, sobrevivendo.

Retorna à Bouville para organizar o retorno à Paris, Em Bouville percebe que está livre, mas que não resta nenhuma razão para viver, e que Anny conseguiu tirar sua única esperança, agora tudo estava morto, seu passado, Rollebon, mas ele está livre e vivo, “Mas essa liberdade se assemelha um pouco com à morte” p. 229..

Quarta-feira, último dia em Bouville Roquentin vai à biblioteca entregar os livros e aproveita para ler os jornais, nisso chega o Autodidata e senta-se distante dele, depois entram dois garotos e sentam-se na onde está o Autodidata, passado um tempo Roquentin percebe que o Autodidata está “molestando” um dos meninos, mas ele fica indiferente a situação. Depois deixa a biblioteca e vai ao Rendez-vous des Cheminots despedir-se de Françoise e de Madeleine e também para ouvir pela última vez a música some of these days / you’ll miss me honey. Enquanto espera o trem para Paris, começa a pensar na música, na cantora, no compositor e nota na música a existência daquelas pessoas, que a arte os fizeram existir, este pensamento lhe dá uma certa alegria e começa a pensar no que poderia fazer para existir de fato, e começa a ver uma possibilidade de escrever um romance “[...] Um livro. Um romance. [...] Um livro. Naturalmente, no inicio seria um trabalho tedioso e cansativo; não me impediria de existir e de sentir que existo.” P. 258.

Antoine Roquentin vê na literatura um caminho a seguir, conseguir a liberdade e viver com autenticidade, como afirma Candido,

A literatura é, pois, um sistema vivo de obras, agindo umas sobre as outras e sobre os leitores; e só vive na medida em que estes a vivem decifrando-a, aceitando-a, deformando-a. A obra não é produto fixo unívoco ante qualquer público; nem este é passivo, homogêneo, registrando uniformemente o seu efeito. São dois termos que atuam um sobre o outro, e aos quais se junta o autor, termo inicial desse processo de circulação literária, para configurar a realidade da literatura atuando no tempo (CANDIDO, 1985, p. 74)


Roquentin não toma nenhuma decisão, mas uma leitura possível é que ao escrever uma ficção, um texto literário, este o abriria as portas para o existir, a literatura tem este papel de buscar respostas, de humanizar e de libertar-se.

REFERÊNCIAS

BONNICI, T. & ZOLIN,L.O. Teoria literária: abordagens históricas e tendências contemporanêas. 2.ed.rev. E ampl. – Maringá: Eduem, 2005.

CANDIDO, A. O escritor e o público. In: CANDIDO, A. Literatura e sociedade. 7. ed. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1985,

SARTRE, J.P. A Náusea. Tradução de Rita Braga. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Coleção Grandes Romances.

1º de Maio Dia do Trabalhador

O Dia do Trabalhador e a Educação

Valdair da Silva*
Marileuza Ascencio Miquelante**

Historicamente o 1º de Maio marca o dia da Luta pela redução da Jornada de trabalho e por melhores condições de trabalho, tais lutas ocorriam em várias partes do mundo, mas foi em 1889, em Paris, que os trabalhadores definiram esse dia como o marco para a luta pela jornada de 8 horas diárias de trabalho.

O trabalho é uma atividade essencialmente humana, por meio dela o homem constrói a si mesmo. Esse significado mais ampliado do trabalho, definido como princípio educativo é central para a educação. Ocorre que na sociedade marcada pela divisão social e técnica do trabalho, prevalece o sentido reduzido do trabalho como modo próprio de produção, que traz a marca de um modo próprio de produção, com o intuito de atender aos propósitos de uma sociedade capitalista.

A centralidade do trabalho, como ação criadora e determinante na organização da vida humana, é por vezes questionada por intelectuais a serviço do capital e de suas ideologias. Basta observarmos os aspectos mais simples do cotidiano das nossas vidas, que ali está expressa a marca do trabalho humano. Todos os objetos utilizados pelo homem para a execução de suas atividades desde as mais simples até as mais complexas são resultados do trabalho humano. No entanto, esses objetos parecem ter vida e poder de determinar o comportamento humano, este é o fetiche da mercadoria. Como exemplo, isso acontece quando se está no supermercado colhendo das prateleiras os produtos que precisamos, ali, naquele momento, diante de nós desaparece todo o trabalho humano e aparece algo, um produto, uma mercadoria com vida própria.

Ocorre que vivenciamos na atualidade um tipo específico de reorganização produtiva, em que milhares de trabalhadores são descartados ou sub-utilizados na elaboração de simples atividades marginais dos setores produtivos. Na produção e reprodução mundializada do capital se usa cada vez menos o trabalho estável e cada vez mais o trabalho part-time e terceirização. Tal processo é acompanhado do discurso da qualidade total que traduz a “superfluidade” da produção em geral (ANTUNES, 2005).

Nesse modelo de sociedade, o trabalho foi separado da educação. A educação está a serviço de um adestramento das forças físicas e mentais dos trabalhadores para que, no exercício de uma atividade qualquer, eles possam sem maiores dificuldades, compreender e executar os comandos, sejam eles diretos ou indiretos. Nesse caso, saber decodificar os comandos simples das máquinas já é suficiente, não é necessário e não lhes é exigido saber a significação do que está lendo ou realizando.

Pensar no trabalho e na educação numa perspectiva transformadora implica na possibilidade de uma formação que abarque a pessoa em sua totalidade, uma educação que supere a visão míope de educar para o mercado, abrindo caminhos para uma educação que contemple os princípios da politecnia. Ao optar por essa proposta de educação é possível ampliar as condições “omnilaterais”, mas tal formação não é de interesse da classe hegemônica, já que coloca em disputa um projeto maior de sociedade que passa, necessariamente, pelo que ensinar e como ensinar na escola.

A educação escolar é uma atividade humana, processo no qual se socializa o conhecimento produzido ao longo da história, de modo a ampliar as faculdades teóricas e práticas que traduzem o ser singular e histórico: o homem concreto.
Nesse sentido, como a educação escolar pode contribuir para a ação transformadora dos filhos da classe trabalhadora? O processo de educação escolar no Brasil traz a marca da dualidade do ensino e romper com essa dualidade será o primeiro passo para se obter uma educação transformadora, bem como a superação da dualidade de classe.

É importante lembrar que a escola, por si só, não dará conta de tal superação, já que estamos inseridos numa sociedade capitalista que se funda na divisão social e técnica do trabalho, exigindo, portanto, o engajamento social e político da classe trabalhadora.

Sabemos que o papel da escola é socializar o conhecimento produzido historicamente, num projeto de educação fundamentado numa determinada concepção de homem e sociedade e que isso deve estar explicitado no Projeto Político Pedagógico. O trabalho, a ciência e a cultura devem ser os pilares desse processo para que tenhamos uma nova sociedade.

Infelizmente, o projeto maior de superação da sociedade de classe passa desapercebido – em geral, pela classe trabalhadora como um todo – na medida em que a busca pela subsistência imediata a impede de assumir posturas políticas e sociais de transformação do status quo.

O 1º de Maio de 2011 não poderia ser apenas mais um dia de festividades, geralmente, financiadas pelos “patrões”, mas ao invés disso, poderia ser um novo marco na histórica resistência da classe trabalhadora, que anseia ver seus filhos e filhas crescendo e se desenvolvendo como homens e mulheres livres para escolherem seus próprios destinos.